Friday, July 02, 2004

 

Emoções baratas

Era seu primeiro dia de trabalho, estava inseguro. Não esperava vender muito hoje, mas tinha esperanças de melhorar com o tempo. O trem chegou. Pegou sua velha pasta de couro, que já aparentava mais idade que seu dono, colocou-a debaixo do braço, colocou a sua boina da sorte, ajeitou o colete embaixo do terno e entrou no vagão anunciando seu produto.
“Sentimentos! Saudades dos velhos tempos, perdão para antigas amarguras, cobiça para acomodados. Temos de tudo, baratinho”. Vai um minha senhora? Quer quantos meu senhor? Procura por algo jovem?
A idosa do fundo pediu saudades, pelo falecido esposo de quem já mal se lembrava. O senhor de barbas preferiu um pouco de melancolia. Queria ser poeta, escritor. O trombadinha lhe apontou a faca. Levou alegria, de graça, e se esqueceu do dinheiro.
A loira de jeans desbotados e rabo de cavalo com olhar longe pediu amor. Esvaziou a bolsa, tirou de lá angústia, tristeza, amizade, adoração, estupor, remorso, calma. Abriu o zíper de fora e continuou procurando: fé, honra, ciúme, medo, ousadia. Nada de amor. Desculpou-se. O amor estava em falta. Deu à loira persistência, de brinde.

|
Comments: Post a Comment

<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?